O Último Porto


(by Miss Blue)

Mr. Budget, há sítios que, à partida, têm tudo para não ter nada a ver connosco. Normalmente, esses são os sítios aos quais não vamos. Tomemos o exemplo do Último Porto. Fica no meio do espaço do porto de Lisboa, entre contentores e acessos de cruzeiros. É preciso atravessar uma ponte para lá chegar e o espaço não é particularmente convidativo: a esplanada fica em cima de alcatrão e o espaço interior tem o pé-direito altíssimo, em mármore, numa sala tão fria como a luz de inverno que reflecte.


 Após este impacto inicial, observamos as mesas e percebemos que mais de 70% dos comensais são homens brancos, na faixa 40-60, com particular preferência por botões de blazer dourados, gravatas azul-bebé, camisas com colarinhos brancos e, muitas vezes, carros inversamente proporcionais à sua altura. E a qualquer hora da refeição, pode ter a certeza que vai poder cheirar um charuto, uma cigarrilha, ou mesmo um gitanes.


O serviço demora. Mas demora mesmo. É quase certo que a sua dose só chega 20 a 30 minutos depois de a ter pedido. Por isso, não há ninguém que vá lá almoçar num ápice, ou que só queira o prato do dia. E é por essa demora, precisamente, que nós lá vamos Mr. Budget. É por essa razão que entramos numa área com a qual não nos sentimos minimamente identificados; é a lentidão garantida do serviço que nos diz: podes estar fora de pé, mas vais sair daqui a nadar de braçada larga.

Porque o Último Porto, Mr Budget, é o sítio onde vai comer peixe tão fresco como se estivesse nos restaurantes ao lado da doca de Peniche. Onde fica sentado na esplanada entre contentores com a mesma confiança que sentiria se estivesse no grelhador mais veterano de Setúbal. Porque é tudo tão bom, tão bem grelhado, tão feito na hora e tão, mas tão bem servido, que só pode ser fresco e acabado de fazer da forma mais tradicional possível.

Os chocos e as postas de garoupa grelhados são apanágio da casa, mas se estiver num dia mais humilde, quer de bolso quer de apetite, uma dose de carapaus dourados, com leve aroma mariscador, restauram a sua fé na nossa economia e quase o convencem a comprar uma traineira e fazer-se ao mar, para que haja sempre um Último Porto seguro onde atracar.

Onde sentar: nas mesas da esplanada a aproveitar o sol de inverno;
O que pedir: peixe grelhado;
Como se comportar: como se andasse de fato todos os dias;
O que levar: o financial times, a economist ou o boletim das pescas;
Com quem ir: com amigos sem pressa, com os pais ou com estrangeiros que acham que peixe é carne branca com molho por cima.
Quanto pagar: o que lhe pedirem, que é merecido. E nada de ser sovina com a gorjeta. 20%, no mínimo.