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Cervejaria da Esquina

(by Miss Blue)

Eu também tenho dias, Mr Budget. Tenho dias nublados, em que me apetece andar de sapatos rasos; dias sufocantes, em que sonho com a vida ao ar livre; dias plúmbeos, em que só me apetece sentar a uma mesa e pedir uma garrafa sem fundo de coragem líquida. A bem da minha imagem e da minha saúde, tento não lhes ceder.
Mas para os dias salgados, aqueles em que o mar apetece tanto que só uma mudança de carreira como pescadora de caranguejo do alaska parece satisfatória, tenho um truque para me esquivar a uma ida a cervejaria que não acabe a cheirar a fritos, onde não precise de voltar a usar babete e, acima de tudo, onde ninguém insinue através da distribuição sub-reptícia de toalhetes que devo desinfectar as mãos com limão assim que acabo de lanchar. Nesses dias, saio de casa às 19.30, atravesso uma estrada, ando um quarteirão e entro numa esquina. Mais precisamente, na Cervejaria que lá fica.
Mato saudades do mar, não entrando dentro dele, mas aproximando-o com arte de todos os meus sentidos. Começo pela vista, de preferência para o tanque onde lagostas e sapateiras marcam o seu território. 
Segue-se o olfacto, quando um dos muito simpáticos empregados chega à mesa com o pão leve e estaladiço e um enchido em carpaccio que desaparece antes da chegada da primeira imperial. 


Depois é a vez do palato, que refresca com a dita; aquece com o creme de marisco espesso e quase decadente; ou arrefece com o recheio de sapateira da casa – apresentado com a casca a observar a taça, onde o seu eu interior jaz, enriquecido com outros ingredientes deliciosos que só fazem o seu sabor sobressair. 



O tacto é estimulado de seguida, assim que o prego de atum chega à mesa – tenho de lhe pegar, de lhe pôr mostarda, de o fechar, de o trincar e de não o deixar cair ante a explosão de pura delícia e total êxtase marítimo. As batatas fritas que peço sempre à parte também têm um papel importante, com os seus gomos gordos salpicados de sal grosso a encherem os meus dedos de pura indulgência – a sensação de juntar fast food e marisco só nunca é completa porque os sabores são demasiado suaves e sofisticados, mas que sabe a pecado, sabe.

Acabo a refeição com um café e um audível “ahhhhhhh”, quando a maior parte das pessoas sérias e sofisticadas começam a chegar para jantar as suas saladas de rúcula e lavagante; os seus caris de camarão e as suas açordas de gambas. 
É nessa altura que saio, sem ainda ter provado a tarte de leite condensado, porque o meu sexto sentido me garante que depois de dar esse passo, já não há regresso; irei todas as semanas cometer um pecado capital nesta cervejaria que é chique para muitos e uma espécie de território neutro para mim, nunca fazendo lá uma refeição completa, só acalmando a vontade de dar sal, muito mais sal aos dias blue.