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A Taverna

(by Miss Blue)

Mr Budget, aqui está uma ideia. Ir almoçar à Taverna, ou O Restaurante Onde Ir Caso Se Queira Ter A Sensação De Estar Em Óbidos. Por outro lado, é também O Sítio Errado Para Ir Almoçar Quando Se Vai Trabalhar À Tarde E Não Se Pode Cheirar A Fritos. Estas são as balizas, mas no meio cabem 4 salas pequenas, encadeadas em jeito de labirinto, entre paredes de pedra e mesas e cadeiras de madeira assentes em lajes tortas. Também cabe um conceito de comida portuguesa muito típico: meia-dúzia de modernices palermas com nome de coisa que não são e uma clara maioria de pratos que matam as saudades de fins-de-semana no norte do país. As simpáticas senhoras (donas?) que atendem só perdem a compostura quando se pede cola zero para acompanhar as iguarias; mas estamos a falar de um almoço e o trabalho não se compadece com ingestão alcoólica de qualquer tipo. E começa o desfile: queijos secos não facilmente identificáveis mas aceitáveis; azeitonas pretas gordas sem acrescentos de tempero; pão com chouriço quentinho a estalar; e uns “miminhos do mar” que são na verdade pasta de atum com alcaparras. Como o atum funciona sempre com alcaparras, não é de admirar que seja uma boa entrada, apesar de muito pouco tradicional. Só não se provou um chourição fatiado que transpirava como se tivesse acabado de sair do frigorífico, o que nunca inspira respeito num enchido. Com uma oferta simpática de vinhos a copo, quem tem muito fígado e pouco sono pode tentar acompanhar a refeição com um pouco mais de dignidade. Uma das especialidades da casa - o pato escondido, que pelas descrições vem num recipiente original e bem fumegante – foi ignorada: havia uma proposta bastante irresistível. Linguadinhos fritos com açorda de coentros. Nunca se recusa uns bons linguadinhos fritos, com os lombos a brilhar de brancos e magros depois de se afastar o polme. Muito menos quando há um açorda bem temperada de alho e generosamente abastecida de coentros frescos e muito aromáticos a acompanhar. Sabe Mr Budget, isto pode ser pouco blue, mas é a mais pura verdade – nunca se deve recusar uma açorda, ponto. Uma açorda tem aquela capacidade rara de aquecer o corpo e a alma sem pesar na barriga. Foi uma escolha muito acertada, que deixa grande vontade de repetir e de dar a conhecer a outros apreciadores de coisas boas que não sejam fãs de arriscar. Também foi pedido um bife com molho de pimentas, que vinha com óptimo aspecto mas tinha como mais-valia absoluta a mini-cesta de vime que trazia as batatas fritas às rodelas, tipo cesto do Capuchinho Vermelho. Não se comeu doce mas o pudim tinha bom aspecto. Com a ajuda de um café e da subida da Rua das Amoreiras, foi possível sair ilesa desta experiência taverneira sem sentimentos decadentes de culpa. Só o sabor da açorda e o cheiro a fritos é que ficou.

Restaurante Isaura

(by Mr. Budget)

Passamos a entrada e não há ninguém, há um hall, uma casa de banho e uma escada que só nos dá uma hipótese: mergulhar no abismo. Descemos com a segurança de uma reserva feita uma hora antes.

Isaura Restaurante

No subsolo somos recebidos pelo chefe de sala, um móvel de madeira escura que ladeia todo o restaurante e ostenta, orgulhoso, centenas de garrafas de vinho e ainda a certeza de que a reserva não era necessária. Contando com a nossa, apenas três mesas ocupadas. Não era assim tão cedo, Miss Blue, seria por ser segunda-feira véspera do dia em que a implantação da república fazia 100 anos? Avançamos para a mesa do canto. Assim que nos sentamos, presunto com melão, pão um pouco duro, bolachinhas banais e uma taça com umas deliciosas uvas douradas sentam-se connosco. Um queijo de Nisa chega um pouco depois e assenta muito bem. A escolha do vinho implicou um namoro com a nossa moldura vinícola e pareceres detalhados do chefe de sala, que se veio a revelar um dos patrões do Isaura (confissão do empregado) e escanção com direito a alfinete de peito em forma de parra.

Copo Isauriano

Claro que os pratos já estavam escolhidos, Bacalhau com Migas à Figueiró dos Vinhos, uma das especialidades da casa, e duas doses de Pataniscas, que vinham com recomendação prévia e vieram ora com feijão frade ora com arroz de marisco. Depois pedimos direcções, apontando para uma garrafa aqui, uma garrafa ali. Grous? Ameias? Periquita? Mas vamos já esclarecer – Querem um bom vinho ou um grande vinho? – Hesitamos e a conversa pára no Douro Collection 2007 da Casa Ramos Pinto – um vinhão – nas palavras do nosso conselheiro. Como sabemos que vamos beber mais que uma garrafa, que o preço unitário é 25 euros e que um dos comensais está irremediavelmente atrasado, adiamos a recomendação e optamos por um Filipa Pato Ensaios que “equilibra muito bem a Baga com o Touriga nacional”. É um dos dois elementos femininos que me acompanha a fazer a prova, até porque o vinho é feito por uma senhora.

O Isaura baila connosco e com os preconceitos que se podem ter dele. Atente nos pormenores, esta é uma casa fundada em 1952 pela mulher que lhe deu o nome, antiga apresentadora de circo, orgulhosamente nascida na Meia Laranja, moradora no Martim Moniz e com experiência gastronómica ganha na feira popular. Tudo poderia indicar que se trata de um restaurante taberneiro e picaresco onde o menu do dia seria Caldo de Heroína e Sandes de Courato com Redução de Pelos de Mulher Barbuda e um Carrossel de Natas polvilhado com algodão doce como sobremesa. Mas não, o Isaura é um dos últimos redutos lisboetas dos restaurantes à antiga, daqueles onde nos entregamos sem reservas (trocadilho sem intenção) ao prazer de jantar fora. É verdade que os empregados de camisa branca e laçarote preto convivem com um menu numérico à chinesa, mas preconceitos e incongruências à parte, cara Miss Blue, no final do balanço, nunca nos sentimos pisados, e queremos repetir a dança.

Chegados ao ponto final, hesitamos agora face a uma Encharcada de Mourão. Somos cobardes e contentamo-nos com a Taça de maçã à Isaura, um leite creme acabado de ficar em ponto de rebuçado, uma manga e uma conta que marca €84 euros, €30 para 2 garrafas de Ensaios e €1.25 para as uvas de entrada, baratíssimas se pensarmos que nos abriram o palato de forma magistral.

Demasiado caro para 3 pessoas? Nada disso, valeu cada grainha. Regressados à Avenida Paris, descemos até à Fonte Luminosa e juntamo-nos à multidão e à Real Combo Lisbonense para outro baile, o da república.

Lustres Ilustres e Republicanos