Vou ensinar-lhe um
truque, Mr. Budget. Naqueles dias em que o Chiado está cheio de gente a andar
devagar; com sol a bater na calçada e a cegar-nos em todas as direcções; com um
calor que faz com que um mergulho no Tejo pareça uma boa ideia; fica claro que
estamos a precisar de refrescar as ideias e regressar à civilização. E qual é
uma das grandes epítomes de urbanismo, frieza e tranquilidade? A Áustria, pois
claro. Na impossibilidade de nos dirigirmos imediatamente à Portela para
apanhar um avião que nos deixe num raio de 30km da melhor Sachertorte do mundo,
podemos sempre atravessar de mansinho a Rua Anchieta e, mesmo à esquina, sem
tocar nenhuma concertina, entrar na Kaffeehaus.
Um pequeno reduto
austríaco em Lisboa, onde o ar é fresco, as janelas têm cortinas penduradas a
meio, os jornais e as revistas são de livre consulta e a limonada parece mais
fresca e amarga que qualquer outra. Se for atendido por um empregado louro com
óculos de massa... bingo. Chegou a um estilo de vida mais Monocle e é bom que
venha com fome.
Mesmo
que não saiba dizer “Frühstück”, “Mittagessen”, “Nachmittagskaffee” ou “Abendessen”,
use o seu raciocínio teutónico, dividida os nomes consoante a hora do dia a que
estas refeições são tomadas e vai sempre encontrar opções deliciosas. Mas um
estreante que se preza sabe que irá ter inúmeras oportunidades de voltar e
experimentar as varias delícias tão surpreendentes como impronunciáveis. Gebackener
Leberkäse mit Erdäpfel-Mayonesesalat ou Hühnerbrust mit Gorgonzola,
Walnüssen & Trauben an Blattsalaten ou mesmo Gemüsestrudel
“Steiermark”. Tente pedi-los assim mesmo e observe o olhar complacente de quem
o atender.
Mas se quer o meu conselho, comece com Original Wienerschnitzel mit
Erdäpfelsalat. É a forma mais tradicional de se iniciar. Sim,
sim, nutricionalmente são meros panados com salada de batata, mas é a forma
mais rápida de atravessar 5000 quilómetros à distância que fica entre o garfo e
as papilas gustativas. Se fechar os olhos, até vê os Alpes ao longe.
Neste
espaço onde as crianças são bem-vindas e podem desenhar nas mesas, onde os
pratos do dia e as sopas estão escritas na ardósia, onde tudo é cinza e branco
e madeira e tranquilo, vale a pena pedir um copo de Riesling e ficar só a ver o
movimento blue a passar.
Depois,
toca a provar o que a ementa ou os pratos do dia sugerem (atenção que o
hambúrguer é capaz de alimentar duas famílias etíopes), a descansar e a
saborear cada garfada que o deixar ligeiramente mais nórdico, substancialmente
mais feliz. É essencial guardar espaço para a sobremesa. E é óptimo ir
experimentando as sobremesas do dia, sabendo que cada pedaço é incrivelmente
parecido com recheio de bombom, sabendo nós que nunca se tratam de doces
excessivamente doces, mas sempre com um travo ácido, quase amargo. O melhor é mesmo
perder-se na descrição de Apfelstrudel, Sachertorte, Himbeer-Apfel-Tarte mit
Mandelhobel, Waldfrüchte-Haselnuss-Streuselkuchen ou Linzer-Schnitte e
descobrir com a língua a que sabe cada uma destas sílabas complicadas.
Se
preferir lanchar tem tostas e croissants, se optar por picar tem tábuas de queijos
e enchidos... se quiser beber só um café, ele vem para a mesa numa bandeja com
um copo de água, o que é deliciosamente atencioso.
Sei
que não sou imparcial, Mr Budget. Mas prometo que não fui paga para dizer isto.
Aliás, nós é que pagamos (e bem, uma média de €20 por refeição) para aproveitar
as coisas boas do norte da Europa sem perder a nossa identidade mediterrânica.
É por isso que eles têm também uma bela esplanada, ao sol. Se a temperatura
interior for demasiado amena para temperamentos latinos.
(os
créditos das imagens são do site da Kaffeehaus, porque a minha câmara está uma
lástima)