Faz calor nesta
antiga casa, Mr Budget. Principalmente porque o vinho, que vem em jarros do
tamanho da sua sede, aquece a alma, as bochechas e até ajuda os pensamentos a
fluir melhor.
No meio do
Príncipe Real, esse altar ao bom gosto urbano e ao estilo de vida
hipster-contemporâneo, fica uma casa com ar de adega: descemos uns degraus do
passeio branco que cega quando lhe bate o Sol deste início de Verão e entramos
numa semi-cave, fresca, em pedra, escura qb, a dar tempo aos olhos e ao corpo
para perceber que ali não se brinca, ali não há salada de rúcula nem pratos de
ardósia.
Depois de nos
sentarmos nas mesas comuns – que também há privados a evocar conspirações
sussurradas ou trocas físicas mais íntimas que mera conversa – vem a lista. Uma
série de pratos tipicamente portugueses, tão típicos que quase enganam e
parecem para estrangeiros; principalmente ali, naquele sítio tão
estrategicamente colocado para parecer very typical. Mas depois não é. Tal como
o vinho branco autêntico, que vem do Alentejo profundo com o aroma das
planícies e a secura exacta da terra, os pratos vêm em travessas de alumínio, a
brilhar com a humidade do calor e a gordura necessária para a sua confecção.
Pedimos febras
de porco e filetes de pescada – dificilmente seria de outra nacionalidade, o
nosso pedido. Os 3 filetes estavam pesados, envoltos em polme rico e espesso –
daquele que já só os profissionais e pessoas com mais de 50 anos conseguem
comer sem fazer contas ao número exacto de quilómetros que vão ter de correr
para compensar a extravagância. Com arroz clássico e salada de alface e tomate
bem temperada, esta comensal passou para o segundo filete em esforço e para o
terceiro em enjoo total – mas esta comensal é uma fraquinha armada em
gastrónoma. As suas febras eram fininhas e tinham um aspecto estupendo - temperadas com colorau, Mr Budget? Estavam boas? As batatas fritas de
verdade que as acompanhavam eram gloriosas e deviam fazer companhia aos
filetes, mas esse pedido especial fica para a próxima visita.
Acabámos a
refeição a pedir mais copos de vinho branco (que parvoíce, pedir um jarro
pequeno porque se tem de trabalhar à tarde; o trabalho é sempre relegado para o
seu devido lugar quando visto através de um copo); e uma mousse de chocolate,
caseira, também servida em taça de alumínio, pequena, comestível em
aproximadamente 6 colheradas, como quando éramos pequenos.
É um prazer vir
a esta casa, onde as coisas antigas são trazidas de volta, exactamente para o
local onde deviam estar.
Nota Blue para as senhoras:
é um restaurante tipicamente masculino. Pelas doses e pelo cheiro, pelas mesas
e pelos pratos. O cheiro não se cola ao cabelo, mas fica presente na roupa. Ideal
para um almoço prolongado numa sexta-feira em que se tenha pouco que fazer.