Restaurante Isaura

(by Mr. Budget)

Passamos a entrada e não há ninguém, há um hall, uma casa de banho e uma escada que só nos dá uma hipótese: mergulhar no abismo. Descemos com a segurança de uma reserva feita uma hora antes.

Isaura Restaurante

No subsolo somos recebidos pelo chefe de sala, um móvel de madeira escura que ladeia todo o restaurante e ostenta, orgulhoso, centenas de garrafas de vinho e ainda a certeza de que a reserva não era necessária. Contando com a nossa, apenas três mesas ocupadas. Não era assim tão cedo, Miss Blue, seria por ser segunda-feira véspera do dia em que a implantação da república fazia 100 anos? Avançamos para a mesa do canto. Assim que nos sentamos, presunto com melão, pão um pouco duro, bolachinhas banais e uma taça com umas deliciosas uvas douradas sentam-se connosco. Um queijo de Nisa chega um pouco depois e assenta muito bem. A escolha do vinho implicou um namoro com a nossa moldura vinícola e pareceres detalhados do chefe de sala, que se veio a revelar um dos patrões do Isaura (confissão do empregado) e escanção com direito a alfinete de peito em forma de parra.

Copo Isauriano

Claro que os pratos já estavam escolhidos, Bacalhau com Migas à Figueiró dos Vinhos, uma das especialidades da casa, e duas doses de Pataniscas, que vinham com recomendação prévia e vieram ora com feijão frade ora com arroz de marisco. Depois pedimos direcções, apontando para uma garrafa aqui, uma garrafa ali. Grous? Ameias? Periquita? Mas vamos já esclarecer – Querem um bom vinho ou um grande vinho? – Hesitamos e a conversa pára no Douro Collection 2007 da Casa Ramos Pinto – um vinhão – nas palavras do nosso conselheiro. Como sabemos que vamos beber mais que uma garrafa, que o preço unitário é 25 euros e que um dos comensais está irremediavelmente atrasado, adiamos a recomendação e optamos por um Filipa Pato Ensaios que “equilibra muito bem a Baga com o Touriga nacional”. É um dos dois elementos femininos que me acompanha a fazer a prova, até porque o vinho é feito por uma senhora.

O Isaura baila connosco e com os preconceitos que se podem ter dele. Atente nos pormenores, esta é uma casa fundada em 1952 pela mulher que lhe deu o nome, antiga apresentadora de circo, orgulhosamente nascida na Meia Laranja, moradora no Martim Moniz e com experiência gastronómica ganha na feira popular. Tudo poderia indicar que se trata de um restaurante taberneiro e picaresco onde o menu do dia seria Caldo de Heroína e Sandes de Courato com Redução de Pelos de Mulher Barbuda e um Carrossel de Natas polvilhado com algodão doce como sobremesa. Mas não, o Isaura é um dos últimos redutos lisboetas dos restaurantes à antiga, daqueles onde nos entregamos sem reservas (trocadilho sem intenção) ao prazer de jantar fora. É verdade que os empregados de camisa branca e laçarote preto convivem com um menu numérico à chinesa, mas preconceitos e incongruências à parte, cara Miss Blue, no final do balanço, nunca nos sentimos pisados, e queremos repetir a dança.

Chegados ao ponto final, hesitamos agora face a uma Encharcada de Mourão. Somos cobardes e contentamo-nos com a Taça de maçã à Isaura, um leite creme acabado de ficar em ponto de rebuçado, uma manga e uma conta que marca €84 euros, €30 para 2 garrafas de Ensaios e €1.25 para as uvas de entrada, baratíssimas se pensarmos que nos abriram o palato de forma magistral.

Demasiado caro para 3 pessoas? Nada disso, valeu cada grainha. Regressados à Avenida Paris, descemos até à Fonte Luminosa e juntamo-nos à multidão e à Real Combo Lisbonense para outro baile, o da república.

Lustres Ilustres e Republicanos