O Peregrino:

(by Miss Blue)

Mr Budget, de certeza que uma busca rápida no Google vai esclarecer todas as dúvidas – Santiago do Cacém deve estar na rota dos caminhos para o outro, mais a norte, de Compostela. Além disso, tem um castelo que data do século 8, o que lhe confere uma seriedade bastante respeitável; e uma igreja matriz que dá vontade de casar só para começar uma vida nova com vista para o futuro que se estende até ao mar. Não é uma vila bonita, mas compensa o que lhe falta em beleza com carradas de história e um hotel muitíssimo interessante. O Caminhos de Santiago resulta da fusão entre a antiga pousada e um projecto arquitectónico inovador, que cria uma harmonia verdadeiramente dissonante na paisagem em redor. Mas como nós gostamos é de mais comida e menos conversa, passo a explicar o que me fez perder por esta zona: este hotel tem um restaurante, apelidado de “O Peregrino”, com carta da autoria do chefe José Júlio Vintém e que se propõe a destacar o melhor que a gastronomia alentejana tem para oferecer – motivo mais que suficiente para uma deslocação cheia de fé.
Tive a oportunidade de provar o jantar e o brunch neste restaurante, e, no espírito devoto em que estou, recomendo ambos vivamente – embora o jantar custe mais que o pequeno-almoço e a estadia juntos.
Provados e aprovadíssimos foram o couvert, com queijo fresco de cabra; manteiga de cabra com alecrim e peixinhos da horta com  feijão-verde de verdade e o pão alentejano fresco e torrado servido num saco de pão à antiga em cima da mesa. A entrada que escolhemos, um queijo de cabra assado no forno com alho, azeite e mel era muito saboroso, mas não particularmente inspirado. Já os pratos principais limparam qualquer dúvida que tivesse restado no prato da entrada: um bacalhau gratinado com espargos verdes e salada de espinafres frescos e um lombo de porco confitado com maçã e servido com arroz cremoso de courgette provocaram silêncios saboreados em comunhão perfeita com o momento. Todos os ingredientes tinham o peso certo e o protagonismo temporal exacto para que o próximo se lhe seguisse ordeiramente, sem empurrar. Tivemos muita pena de não provar a garoupa corada com açorda de poejos, mas demorava 40 minutos a preparar e a vontade de provar tudo não estava de acordo com tamanha espera. Bebemos um Herdade dos Grous a acompanhar, impecável como sempre, que nunca dominou qualquer sabor do prato. Para finalizar, porque ir ao Alentejo e não comer sobremesa é um pecado capital, dividimos uma torta de laranja recheada com compota da mesma e redução de Porto que estava fresca, doce e absolutamente divina. Devo acrescentar uma nota, Mr Budget. Ir a um restaurante com estes pratos e estas características com uma criança podia ser um enorme foco de tensão. Mas não foi. Porque a contar com os pequenos visitantes, até há um prato de salsichas com ovos e arroz que, apesar dos ingredientes plebeus, se apresenta com o mesmo bom aspecto dos restantes pratos e em formas quadradas, o que diverte e dá um sentimento de importância às Pessoas Pequenas, que também provam e saboreiam como se soubessem o que estão a fazer. Também há gelados caseiros de frutas locais que acabam as refeições de forma saudável e nada indutora de stress por causa do chapéu do Pingu.
Acrescento ainda uma nota de mérito absoluto ao brunch do dia seguinte: servir iogurtes caseiros, compotas de figo e de abóbora, fatias douradas e bolos quentinhos à fatia é um sonho tornado realidade para qualquer pessoa que sonhe com pequenos-almoços de rei. Mr Budget, é demasiado fácil passar a acreditar num ser superior depois de tanta religiosidade posta no bom trabalho e nos magníficos ingredientes da cozinha neste local. Peregrine até lá e aproveite para comungar, sem necessidade de confissão.