Mar à Vista

(by Miss blue)
Caro Mr. Budget, se quer mesmo ver este mar, é-lhe exigido que saia de Lisboa, atravesse a região saloia, faça quilómetros de auto-estrada, seguidos de mais quilómetros numa estrada frequentada por tractores agrícolas, motoretas assassinas e condutores de domingo. Depois tem de encontrar um lugar para estacionar nas ruas estreitas em calçada, nada aconselháveis a sapatos para menores de 60 anos. Chegado ao largo da Praia dos Pescadores, tem uma entrada mínima para uma sala igualmente pequena, seguida por duas saletas mais pequenas ainda. Aos incautos, ninguém explica que é politica da casa não haver café nem multibanco, pelo que é o restaurante da Ericeira com maior índice de refeições interrompidas para levantar dinheiro. (Quem já tiver tentado num fim-de-semana, sabe que é raro encontrar caixas a funcionar.) Está sempre cheio de todo o tipo de gente, das famílias mais típicas da zona aos bigodes e casacas mais insuspeitos. Em hora de refeição, conseguir uma mesa é quase tão difícil como no Nobu. Não estou a exagerar. As pessoas fazem mesmo fila para estraçalhar patinhas e patonas de crustáceos, para ficarem a cheirar a comida, para salpicarem os vizinhos da mesa do lado com a água dos percebes – já disse que o sítio é infernalmente pequeno? – para ouvir o empregado mais novo falar francês emigrado com os estrangeiros e o empregado mais velho tratar toda a gente por Sr. Doutor, com algumas variantes de Sr. Engenheiro. Quem percebe do assunto, diz que a qualidade e a variedade do marisco são louváveis. Quem ouve a conversa diz que é mesmo a melhor marisqueira da zona.
Sabe, Mr. Budget, a verdade é que os percebes são do melhorzinho que se come fora de Vila do Bispo, mas como melhorzinho NÃO chega, a minha sugestão vai mesmo para as bruxas (quando as há, raro e creio também, clandestino) e para a santola com recheio tradicional. Se as acompanhar com um branco simpático (o único da carta), quase consegue esquecer as eventuais cotoveladas, que nunca serão menos que 6.
Não vale a pena pedir sobremesa nem passar os dedos em toalhetes pindéricos com cheiro a detergente; pague em dinheiro, dirija-se imediatamente à casa-de-banho, lave as mãos e saia. Vá ver o mar, que dentro do restaurante, nem pela janela.